Por Wilson Torres Nannini
Quando criança, tinha uma fantasia do Batman. Ensaiava, em minhas histórias, salvar o mundo, a começar pelas meninas mais bonitas da terceira e quarta séries, vítimas de pérfidos criminosos que queriam destruir Botelhos com terremotos, redemoinhos e castigos atômicos. Penso se isso contribuiu para que eu me tornasse policial.
Nos ritos de formatura, os soldados da Polícia Militar bradam juras de servir à sociedade, mesmo com o sacrifício da própria vida. Mas, como Pedro alegara que seguiria Jesus aonde quer que Ele fosse, morrer por outra pessoa pode ser uma promessa proferida apenas com os lábios impetuosos.
O medo da possibilidade e da aparência da catástrofe expõe que nossa coragem pode ter alicerces fragílimos. Quando Maria Madalena chora no sepulcro vazio, meio-instante antes de lhe ser revelada, pelo próprio Jesus, a Sua ressurreição, temos o espelho gritante do que é a ausência de fé. Sem fé, cada dia de nossas vidas é como um criminoso condenado, que faz de sua cela provisória um sepulcro perpétuo.
Assim como o exato contrário do amor é se conformar com uma morte definitiva em vida, é no remanso da certeza da ressurreição que até mesmo nossas preocupações mais vorazes cessam. Enfrentamos tiroteios. Lançamo-nos na liberdade de amar com honestidade até nossos semelhantes mais hostis. Seremos ressuscitados! O que devemos temer?
A falta de fé nos leva à traição, nos conduz à negação. Somos Judas distribuindo beijos venenosos. Somos Pedros voltando a ser Simões, voltando a pescar ao invés de cumprir a ordem divina de proteger o rebanho do Senhor. Queremos a ressurreição, mas dispensamos os dissabores da morte.
Será que supomos que, quando pecamos, descemos à mansão dos mortos, mas que podemos ressuscitar no mesmo dia? Quando perdoamos e somos perdoados, é ressurreição. Quando deixamos que nossos desejos imprestáveis morram, é ressurreição. Quando desafetos se reconciliam, é ressurreição. Quando casais renovam seu amor, é ressurreição. A ressurreição é um sacramento constante.
O mais tocante texto bíblico é, para mim, o do triplo perdão a Pedro, no Lago Tiberíades. Jesus nos dá um assalto de ternura e compreensão. Como nossa fé é miserável, Jesus ajusta os termos de Seu plano de salvação a um nível em que somos capazes de cumprir. Ele quer nossa ressurreição. Então, Se põe misericordioso à espera de nossa resposta à Sua pergunta três vezes repetida: “Tu me amas?” Eu ainda hoje Lhe respondo: “Senhor, Tu sabes tudo! Sabes que eu morreria por Ti e por qualquer um desses pequeninos. Mas, se puderes, afasta de mim esse cálice.”
Wilson Torres Nannini, da safra de 1980, casado com a Carolina, é policial militar de Minas Gerais. Vive, trabalha e serve em Botelhos/MG. É autor dos livros de poemas “alcateia” (2013) e “escafandro” (2015), ambos pela Editora Patuá.