Ao lado do domingo como dia regular da comemoração da morte e ressureição do Senhor, houve também, desde os primeiros séculos uma comemoração anual da Páscoa. O Apóstolo Paulo não deixa dúvida de que a festa da Páscoa judaica assumira novo significado para os cristãos: “Pois Cristo, nosso cordeiro pascal, foi imolado” (1Cor 5,7). Esta ressignificação da festa anual dos judeus permite-nos supor que as comunidades cristãs primitivas celebravam com entusiasmo e alegria e grande solenidade a Páscoa cristã no período da Páscoa judaica.
O primeiro Concílio de Nicéia, ano 325, prescreveu que a data da Páscoa cristã deveria ser no domingo depois da primeira lua cheia da primavera, para o hemisfério sul, outono, distinguindo-se da data da comemoração judaica que é o dia 14 de Nisã, um domingo anterior à data da Páscoa cristã.
A celebração do Mistério Pascal de Cristo, seguindo o modelo judaico de Festa das Semanas, não termina no domingo de Páscoa, mas prolonga-se por sete semanas ou cinquenta dias que lhe sucedem, culminando no Domingo de Pentecostes. A Páscoa de Jesus é a chave interpretativa para a história de cada indivíduo e de toda a história da humanidade.
Em Jesus de Nazaré, Cristo Senhor ressuscitado, aquele sopro de vida, depositado inicialmente na criatura, conforme o Livro do Gênesis, atinge uma maturidade pessoal única, porque nele habita a plenitude da divindade, a do Filho Unigênito do Pai, que se fez um de nós. A humanidade e cada ser humano individual tem a possibilidade de ver realizada, por dom de Deus, a grande e misteriosa esperança de uma “nova terra e novos céus” (Ap 21,1), um mundo sem luto, sem lágrimas, pleno de paz e júbilo na posse da vida sem fim (Ap 21,4).
Isto só é dado perceber aos olhos de quem reconheceu e experimentou Cristo ressuscitado com a melhor notícia que nos foi dada. A morte foi vencida, pois as potências do mal foram igualmente derrotadas, ainda que por enquanto não tenha sido plenamente realizado o objeto final do Projeto Salvador de Deus já trazido por Cristo pela sua Páscoa.
Ao contrário da nossa vida natural e mortal, que nos é dada sem nosso consentimento, a nova existência em Cristo só é dada aos que livremente acolherem à proposta de renascer através da conversão, do batismo, da eucaristia e de uma vida cristã imersa no Mistério Pascal de Cristo.
Desta forma celebrar a Páscoa significa celebrar eficazmente como realização potente a passagem de um modo de viver para outro. É a saída do Egito, a imersão no mar Vermelho e a caminhada pelo deserto até o lugar da Promessa: “a terra onde correm leite e mel”. É o nosso êxodo “deste mundo ao Pai” (Jo13,1).
Quem caminha na nossa frente, conduzindo-nos como o bom pastor é o Ressuscitado, cabeça de um povo sempre revivificado pelo sopro do Espírito que ele nos enviou em Pentecostes. Esta nova criatura é o ser humano como Deus o criou desde sempre. Não é uma outra criatura alienada da sua condição terrestre, mas a mesma criatura vivendo nas limitações da sua condição.
A Páscoa de Jesus aponta para nós o nosso futuro absoluto em Deus, que nos encoraja a superar as vicissitudes do presente histórico. Este “novo homem”, renascido em Cristo realiza em si, para si e para os demais a vontade de Deus, que o admite, em Cristo, à condição de Filho amado: “filii in Filio”, filhos no Filho. Mais do que celebrar, vivamos permanentemente a nossa Páscoa pessoal e a Páscoa de toda a humanidade.
Padre José Cândido
Pe. José Cândido é pároco da Paróquia São Sebastião - Região Centro - Sul, de Belo Horizonte, MG, e Redator Chefe do Katholika.