O fim de um ciclo litúrgico
Ao celebrar a solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, encerra-se, assim, o Ano Litúrgico, já que é celebrada no último domingo do Tempo Comum.
Instituição da Festa pelo Papa Pio XI
Embora a referência a Cristo como Rei esteja presente até mesmo nas profecias do Antigo Testamento sobre o Messias, a festa litúrgica foi instituída em 1925 pelo Papa Pio XI. Para criação da festa, o papa escreveu a encíclica Quas Primas, que explica o sentido da celebração e aborda a importância do reinado de Cristo na sociedade e nos corações.
O profeta Isaías fala do reinado do Messias ao dizer que um de seus nomes é Príncipe da Paz e que “o seu império se estenderá cada vez mais, e a paz não terá fim; assentar-se-á sobre o trono de David e sobre o seu reino, para firmá-lo e fortalecer em juízo e justiça, desde então e para sempre” (Is 9, 6-7).
No Novo Testamento, na anunciação, o anjo Gabriel diz a Maria Santíssima que o reino de seu Filho “não terá fim”. Na narração do juízo final feita em Mateus 25, Cristo reivindica para si o título de Rei.
Quando Pilatos, no pretório, pergunta a Jesus se ele é rei, sua resposta é contundente: “Sim, eu sou rei. É para dar testemunho da verdade que nasci e vim ao mundo” (Jo 18,37). O Apocalipse diz que Jesus é o “soberano dos reis da terra” (Ap 1,5) e o “Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Ap19,16).
De acordo com o papa Pio XI, Cristo possui não somente a realeza espiritual, conforme amplamente testemunhado pelas Escrituras, pela Tradição e pela liturgia, mas sua realeza é também universal.
“E, neste particular, não cabe fazer distinção entre os indivíduos, as famílias e os estados; pois os homens não estão menos sujeitos à autoridade de Cristo em sua vida coletiva do que na vida individual. Cristo é fonte única de salvação para as nações como para os indivíduos” (Quas Primas, 14).
A festa foi instituída poucos anos após a Primeira Guerra Mundial e foi uma resposta ao crescimento do laicismo, do liberalismo, do ateísmo e do comunismo.
Para Pio XI, o cristianismo estava sendo relegado ao âmbito puramente eclesial e “a soberania de Cristo sobre todas as nações”, negada. O pontífice chama a atenção ainda para aquelas nações que, além de rejeitarem o reinado de Cristo, fizeram da irreligião sua religião. A encíclica lembra ainda que a nova festa “será sobremaneira eficaz para condenar e ressarcir, de algum modo, esta apostasia pública, tão desastrosa para as nações, gerada pelo laicismo” (25).
Guerra Cristera
Apenas um ano depois da instituição da festa, os católicos mexicanos se levantaram contra o governo do presidente Plutarco Elías Calles, que pretendia subjugar a Igreja ao Estado, proibindo as manifestações religiosas públicas, a existência de congregações religiosas e qualquer tipo de ação dos cristãos no âmbito político. Como os movimentos de protesto foram reprimidos pelo governo, milhares de católicos resistiram de forma armada no período que ficou conhecido como Guerra Cristera (1926-1929).
O grito de batalha dos cristeros era “Viva Cristo Rei!” e “Viva a Virgem de Guadalupe!”, respondendo, assim, ao recente apelo de Pio XI para que o reinado de Cristo fosse reconhecido também na sociedade.
Sobre a guerra, o mesmo papa afirmou que “a licitude do conflito contra as autoridades civis era justificada por conter as condições de causa muito grave, esgotamento dos meios pacíficos e pelos cristeros terem alguma probabilidade de êxito, pensando-se também que a violência empregada não produziria males maiores do que os que pretendem mediar”.
São João Paulo II canonizou 25 mártires mexicanos desse período, entre religiosos e leigos, e o Papa Francisco canonizou em 2016 o jovem José Luís Sánchez del Río. Outros mártires foram beatificados e estão em processo de canonização.
O Papa Pio XI instituiu a Festa de Cristo Rei para ser celebrada no último domingo de outubro. O Papa Paulo VI, durante a reforma litúrgica, transferiu a celebração para o último domingo do Tempo Comum, recordando também a dimensão escatológica da festa.
Ezequiel Carneiro