Por Gilvair Messias
Talvez seja!
Se olharmos bem, o que mudou? Que transformação aconteceu para decretarmos um novo tempo? O sol não sabe que é 2022, nem a terra. Então fomos nós que inventamos o tempo diante da passagem da vida.
Só para nós humanos existe história. Tornamos passado não só o que passou, mas os acontecimentos que promovemos. Só há presente porque podemos afirmar-nos como pessoas pensantes e realizadoras de atos. E o futuro só existe enquanto esperança, enquanto capacidade projetiva. Ele existe dentro de nós, talvez cochilando.
Então o tempo é esta coisa que criamos porque nos entendemos produtivos, construtivos, vivos. De algum modo, porque um dia soubemos que iríamos morrer que nos tornamos históricos e temporais. O tempo tem início com a consciência da própria finitude.
Alguns dizem: nossa, o tempo está passando muito rápido. Será mesmo? De um lado, sim. A compreensão de que o tempo está rápido vem do próprio ritmo da vida. O tempo, em si próprio, tem a mesma contagem. Mas nosso ritmo está mais acelerado, o que faz, em âmbito social, que entendamos o tempo como mais veloz.
De fato, o que compreendemos por tempo é o que ele significa. O tempo da dor é muito demorado, por exemplo. O tempo numa esteira, caminhando. O tempo com pessoas muito queridas é muito breve.
Então, tempo acaba por ser a nossa experiência subjetiva e coletiva de começo e fim das coisas feitas e por fazer. Ele nos traz atribuições. Início do ano tem IPVA. Então, é ano novo. Final de ano tem conclusão escolar.
Nós nos organizamos de modo cíclico porque precisamos de começos e términos. Esta passagem do fim do ano para o novo geralmente traz angústia. É a experiência de não ter cumprido tudo o que devia ser feito e simultaneamente a grande suspeita diante do novo.
São duas grandes pulsões neste tempo: de morte e de vida. De algum modo, temos de morrer um tempo para nascer um novo. Temos necessidade de morrer, de terminar, de fechar um tempo. Se não morremos nossa temporalidade, se não fazemos passados, não damos conta de sonhar, de tentar novamente, de iniciar novas formas de vida.
Construir bem o passado, fechá-lo é o caminho para um futuro melhor. Maturidade talvez seja isto, de tanto fazer passados, temos presentes mais conscientes e futuros mais claros e objetivos. Quando mais jovens, o passado é pequeno e o futuro, imenso, cheio de fantasias e idealizações. Com o decorrer da vida, temos passados maiores e futuros menores. Isto não significa que estamos terminando a vida, mas que tudo o que ainda vivermos não será mais tão novo e desconhecido.
De repente a vida é só isto: o que vamos escolhendo para viver cada dia… Não tenho dúvidas de que somos históricos não só porque temos consciência da finitude, mas também porque temos consciência de nossa grandeza. É do nosso desejo de infinitude que terminamos épocas e recomeçamos outras, pois acreditamos que não temos tempo a perder.
Gilvair Messias é professor graduado em Filosofia, História e Teologia. Mestre em Teologia. Especialista em Comunicação e Cultura e também em Psicanálise Clínica. Autor de livros e administrador do perfil @sentimentos_de_poeta_no_diva.