Pesquisar
Close this search box.

ANO NOVO: O CHEIRO DO NATAL

WhatsApp_Image_2021-12-10_at_12.33.48.jpeg

“E, na aurora, armados de uma ardente paciência, entraremos nas cidades esplêndidas.”

Não pensemos que o poeta francês Arthur Rimbaud, autor do trecho acima, soubesse qual é a expectativa das pessoas que comemoram o funeral do ano velho, com os mesmos estouros de fogos de artifício e espumante com que celebram o nascimento do novo ano. Ano Novo: vida nova! Que os próximos 365 dias lhes indenizem por sonhos e planos que, no ano passado, fracassaram! E nós, katholikos, o que esperamos do Ano Novo?

Férias e folgas são tomadas para viagens à beira mar. Confraternizações diversas. Simpatias pueris. Tudo para ver o ano nascer, dessa vez quem sabe potente da cura de todos os males. O ser humano quer ter esperança! Espera que a vida seja diferente para melhor. Melhores relacionamentos, melhores empregos, paz inabalável: a onipotência da alegria perpétua.

Na contramão dessa vertente, no meu trabalho como policial militar, rezo para estar de folga no Natal. Sei que terei severas horas de trabalho na virada do ano, mas eu amo o Natal, o Natal e sua véspera e o Advento todo!  O ano começa para mim no Natal.

A frugalidade, a manjedoura que se faz berçário, o Deus Menino nascido numa família de escassos pertences. A simplicidade do Natal me constrange, e então me impele a repugnar a tentação de me fazer imperador da verdade nos diversos contatos com meus semelhantes. E mais ainda: a determinação de José exilando sua Sagrada Família no Egito, longe da matança dos inocentes promovida por Herodes, me leva a rogar que Deus me nutra com a coragem necessária para servi-Lo sempre, na minha família, na minha paróquia, no meu trabalho e aonde Ele me remeter.

Sou estimulado a me desenraizar do sofá de onde assisto a entretenimentos pouco proveitosos, e ser bem mais atencioso com minha esposa. Sou impulsionado a desligar o pequeno holofote do celular, e deixar que os olhares ao vivo de meus familiares iluminem minha vida.

Do Ano Novo, espero nada! Espero apenas talvez vitória na Mega da Virada, de modo que, na Paróquia São José de Botelhos, eu possa consagrar um dízimo mais rechonchudo.

Mas do Natal, todos os anos!, espero Vida Nova. Espero que o Verbo acampe em meu coração e faça novas todas as coisas. Meu coração, manjedoura paupérrima, se arma em presépio para que o Salvador nele nasça. É o festejo humilde do coração que promete irmanar-se com todos os corações do mundo! E, todos os anos, espero, na manhã de Natal, armado de uma áurea esperança genuína, chegar para a missa e respirar a mistura do esplêndido odor de incenso da igreja com o alegre e indisfarçável cheiro de rabanada que minha mulher e eu exalamos.

Wilson Torres Nannini

Wilson Torres Nannini, da safra de 1980, casado com a Carolina, é policial militar de Minas Gerais. Vive, trabalha e serve em Botelhos/MG. É autor dos livros de poemas "alcateia" (2013) e "escafandro" (2015), ambos pela Editora Patuá.