As palavras seguintes são descritas como um belo diálogo do cardeal, doutor e poeta José Tolentino, com um simples padre do interior chamado Rener Olegário. Mesmo diante a distância física, sinto que nossas perspectivas de caminho são intimamente ligadas.
Quantas vezes danço e luto com Deus! Estas ações demonstram o constante movimento e envolvimento entre Deus e o homem. O primeiro, próprio dos homens, parte do entretenimento social, humano, resultando na alegria e comunhão. No aspecto divino, apresenta a beleza em movimentar-se para Deus. O segundo é uma ação, um esforço, uma opção ao encontro de Deus, que, necessariamente, haverá dificuldades a superar. Tolentino diz que o movimento é certo, “desencontrar-nos e encontrarmos Deus”. A beleza do movimento é ir e vir, jamais acomodar-se ou temer o movimento, mas juntar-se ao constante devir em Deus.
A luta é um movimento integrado ao ser cristão, pois até o justo, na luta, peca sete vezes (Pv 24,16), representando o simbólico número da totalidade, inserido a luta como essência para o alcance da perfeição do homem; sem ela, não poderá alcançar a Deus. O homem é um ser para luta, ser do combate, o ser para coroa, coroa esta, que recebem somente aqueles que lutam. A luta é movida sempre pela fé que inquieta, pela esperança que instiga a buscar sempre o melhor.
Na dança, o homem não consegue se envolver parcialmente, ele procura sempre a integralidade do corpo, coração e espírito. O dançar é um ato de fé integral, um constante dançar com Deus, pois no decorrer de nossa vida, devemos encontrar o ritmo perfeito, as notas certas, os movimentos alegres, como um dia “Davi dançou com todas suas forças diante do Senhor” (2 Sm 6;14), expressando a alegria de estar com Deus. Ao errar um passo, ao cansar, ou cair, deve sempre levantar, tomar Deus como um íntimo e fiel companheiro e seguir a canção da vida.
Tolentino ressalta que o “dançar é superar os movimentos corporais e deixar que o coração viva e o espírito inspire sempre a novas coisas”. Dançar é movimento, sair de si e ir, encontrar surpresas e confiar, dançar e viver. Abraão foi um exemplo do movimento de sair de sua terra, do dançar com Deus e confiar, de surpreender-se e mesmo assim, continuar a envolver no ritmo das palavras divinas. Em toda história da salvação houve este dançar dos homens, o movimentar-se para Deus, desde juízes, reis, profetas, até o próprio Cristo que exortou a geração: “nós vos tocamos flauta e não dançastes! Entoamos lamentações e não batestes no peito” (Mt 11,17).
O dançar e o lutar não têm estilos definitivos e engessados, mas, surpresas e dinamismos. O ato de dançar pode conter algumas regras, porém, não vividas com o coração e surpreendidas pelo espírito, serão atos frios e monótonos. O lutar precisa de armas e algumas artimanhas, porém, as surpresas do combate e novos inimigos, sempre levarão a criar novas táticas para a mesma luta.
A vida espiritual é dançar e lutar com Deus. Não se pode lutar sozinho, pois perde-se e morre. Não se pode dançar sozinho e sem inspiração divina, pois perde-se e cai. Ambas as ações, sem Deus, perdem a beleza e a glória, a leveza e a conquista, a doçura e a coragem. Deus quer estar conosco, basta lutar e dançar com Ele.
Pe. Rener Olegário
Pe. Rener Olegário Lopes Sacerdote da Diocese de Uruaçu, GO. Licenciado em Filosofia na FASEM, graduado em Teologia no Seminário de Brasília, Pós-graduado em Psicologia Clínica.Um jovem padre para um velho mundo.